Numa altura em que a apresentação do Orçamento do Estado para 2015 está próxima, interessa fazer uma reflexão e um debate sobre o sistema fiscal português. E isto porque ele é um sistema que agrava as desigualdades, já que, por um lado, massacra os trabalhadores e pensionistas e, por outro lado, poupa e isenta os rendimentos dos que mais têm da austeridade e dos sacrifícios.
Para se poder ter uma ideia clara do seu papel, interessa ter presente que para além da distribuição primária, também chamada distribuição funcional, dos rendimentos que assenta na relação Trabalho/Capital, existe uma distribuição secundária, que é feita pelo sistema fiscal que, em Portugal, está a ser utilizado para transferir rendimentos dos Trabalhadores e pensionistas para o Estado com a justificação que é necessário reduzir o défice e pagar aos credores, que são grandes grupos económicos e financeiros, poupando os ricos à austeridade. E isto apesar do nº1 do artº 104 da Constituição da República dispor que “O imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar”. No entanto, o que caracteriza o sistema fiscal português é que ele não se baseia nem em impostos únicos nem em taxas progressivas e, além disso, isenta muitos rendimentos dos mais ricos.
Se analisarmos a estrutura das receitas fiscais de 2014, constatamos que 53% das receitas, ou seja, 19.509 milhões € têm como origem impostos indiretos (Imposto sobre combustíveis, IVA. Impostos sobre Veículos, Imposto sobre o Tabaco, etc), em que as taxas são proporcionais, ou seja taxas iguais tanto para os pobres como para os ricos quando adquirem o mesmo bem. Portanto, são impostos em que não existe qualquer progressividade, em que se paga o mesmo valor em euros tenha-se rendimentos baixos (ex. 8.000€/ano) ou muito elevados (1.000.000€/ano), o que agrava as desigualdades.
Em relação aos impostos diretos (IRS e IRC), constata-se que, em 2014, a receita do IRS, que têm fundamentalmente como origem a apropriação de uma parcela importante dos rendimentos de trabalho e pensões, representa cerca de 73,5% (12.742 milhões €) da receita destes impostos, enquanto a receita que tem como origem o IRC, que incide sobre os lucros das empresas corresponde apenas a 27,5% (4.431 milhões €) das receitas dos impostos diretos. Entre 2011 e 2013, as receitas do IRS aumentaram 2.553 milhões €, enquanto as receitas do IRC diminuíram 540 milhões €. Nos primeiros oito meses de 2014, relativamente a igual período de 2013, a receita do IRS aumentou 869,2 milhões €, enquanto a receita do IRC diminuiu em 111,8 milhões €.
A liquidação da progressividade no IRS, é também visível na sobretaxa de IRS de 3,5%, que é uma taxa fixa, plana, que atinge de uma forma igual (3,5%) a parcela de rendimento superior ao Salário Mínimo Nacional, seja qual for o seu montante, que determina um corte de 800 milhões €/ano nos rendimentos dos portugueses. Continuar a ler →