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As con­tra­di­ções inter-im­pe­ri­a­listas aca­barão por ma­ni­festar-se

A Ale­manha do chan­celer so­cial-de­mo­crata Olaf Scholz, com a sua sub­missão às exi­gên­cias dos EUA para romper as van­ta­josas re­la­ções co­mer­ciais com a Rússia e en­volver-se pro­fun­da­mente na es­ca­lada de con­fron­tação no Leste da Eu­ropa, en­contra-se a braços com pro­blemas eco­nó­micos e so­ciais muito sé­rios. A crise ener­gé­tica em que o ri­co­chete das san­ções à Rússia mer­gu­lhou a União Eu­ro­peia tem aí o seu epi­centro e a re­cessão já anun­ciada pelo Bun­des­bank e o es­pectro de agudas ten­sões so­ciais num in­verno sem o gás russo está a in­qui­etar a classe do­mi­nante.

En­tre­tanto, na­quilo que al­guns verão como uma vulgar «fuga para di­ante» mas que é bem mais do que isso, Olaf Scholz e os seus mi­nis­tros, so­ciais-de­mo­cratas, verdes e li­be­rais, têm-se des­do­brado em de­cla­ra­ções de ex­tra­or­di­nária gra­vi­dade, pois ex­pressam aber­ta­mente as am­bi­ções im­pe­ri­a­listas do grande ca­pital alemão. De­cla­ra­ções que vêm na sequência do gi­gan­tesco salto mi­li­ta­rista em que, a pre­texto da guerra na Ucrânia, foi anun­ciado o co­lossal in­ves­ti­mento na De­fesa de 100 mil mi­lhões de euros e mais de 2% do PIB e a trans­for­mação do exér­cito alemão no mais po­de­roso exér­cito da NATO de­pois do norte-ame­ri­cano.

O dis­curso de Olaf Scholz no pas­sado dia 29 de Agosto, na Uni­ver­si­dade Charles de Praga, é par­ti­cu­lar­mente re­ve­lador das am­bi­ções ger­mâ­nicas em re­lação ao con­ti­nente eu­ropeu, no­me­a­da­mente quando pre­co­niza de­sem­ba­raçar a União Eu­ro­peia de es­par­ti­lhos in­có­modos para o seu do­mínio (como o voto por una­ni­mi­dade na área da po­lí­tica ex­terna comum) e o rá­pido alar­ga­mento do bloco im­pe­ri­a­lista eu­ropeu à Ucrânia, Mol­dávia, Geórgia e países dos Balcãs Oci­den­tais. Trata-se cla­ra­mente de reunir con­di­ções para re­forçar o do­mínio alemão sobre a UE e alargar para Leste a es­fera de in­fluência ger­mâ­nica, um de­sígnio his­tó­rico que está na base da guerra da Ju­gos­lávia, a pri­meira guerra na Eu­ropa do pós Se­gunda Guerra Mun­dial, sig­ni­fi­ca­ti­va­mente de­sen­ca­deada pela Ale­manha.

Mas as am­bi­ções do go­verno de Scholz não se ficam por aqui. Quer for­ta­lecer mais e mais o braço ar­mado da UE como pilar eu­ropeu da NATO e fazê-lo sob a ba­tuta alemã, pre­tensão que o chan­celer su­bli­nhou no seu dis­curso de 16 de Se­tembro pe­rante os res­pon­sá­veis da Bun­deswehr: «como a nação mais po­pu­losa, com maior poder eco­nó­mico e lo­ca­li­zada no centro do con­ti­nente, o nosso exér­cito deve tornar-se o pilar da de­fesa con­ven­ci­onal da Eu­ropa, a força ar­mada mais bem equi­pada da Eu­ropa.»

Pe­rante tais de­cla­ra­ções, se­guidas das do mi­nistro da eco­nomia vol­tadas para a Ásia após uma reu­nião do G7 («a in­ge­nui­dade em re­lação à China acabou»), é im­pos­sível não lem­brar o te­ne­broso pas­sado dos mo­no­pó­lios e da classe di­ri­gente alemã cujas am­bi­ções ex­pan­si­o­nistas mer­gu­lharam a Eu­ropa e o mundo em ter­rí­veis so­fri­mentos e des­trui­ções.

Ao vergar-se às exi­gên­cias da ad­mi­nis­tração Biden de romper com o van­ta­joso for­ne­ci­mento de gás e pe­tróleo russos, o go­verno de Olaf Scholz pa­rece dis­posto a com­pro­meter a sua po­sição de grande po­tência. Mas se é certo que os EUA e a Ale­manha estão es­tra­te­gi­ca­mente unidos na luta para conter e en­fra­quecer a China e também a Rússia, não é menos certo que as con­tra­di­ções inter-im­pe­ri­a­listas com as suas graves con­sequên­cias, tarde ou cedo, aca­barão por ma­ni­festar-se.

“Avante!”, 29 de Setembro de 2022