Nunca compreendi a guerra. E como tal, nunca compreendi porque é que se fabricam armas. Para que servem as armas senão para promover a guerra? O Homem é um ser estranho, ora produz vacinas para promover a vida, ora produz armas para provocar a morte. Dizia o Papa Francisco em 2015: “Sí, existe la hipocresía siempre… por eso he dicho: no es suficiente hablar de paz, se debe hacer la paz. Y quien habla solamente de paz y no hace la paz se contradice, y quien habla de paz y favorece la guerra, por ejemplo con la venta de armas, es un hipócrita.”  Concordo totalmente. Vejamos o ponto 24 da Proposta de Resolução aprovada pela União Europeia (UE) em 28 de fevereiro “apoia firmemente a mobilização do Mecanismo Europeu de Apoio à Paz e o fornecimento de equipamento militar pelos Estados-Membros” e acrescenta o ponto 25 “Exorta os Estados-Membros a acelerarem o fornecimento de armas defensivas à Ucrânia em resposta a necessidades claramente identificadas…”. Falar em paz e aprovar o fornecimento de armas é de facto, hipocrisia.  

Os homens ucranianos (civis) entre os 18 e os 60 anos estão proibidos de sair do país e o presidente da Ucrânia apela a todos que se juntem na defesa do país, fornecendo-lhes armas. A Rússia, país capitalista, tem o maior arsenal nuclear do mundo. Sabemos que é uma luta desigual, totalmente desequilibrada. É urgente apelar à paz e só se consegue a paz se apelarmos a uma solução de diálogo para a resolução do problema. Sabemos que não é fácil, mas é imperativo unir esforços por essa via para que se resolva de uma vez o conflito. Não é com armas, nem com mortos e feridos que se acaba a guerra.

O ser humano tem uma tendência inata ou talvez aprendida para criar sempre dois lados, os maus e os bons. Nas histórias infantis tradicionais e mais conhecidas que nos são contadas na infância e trazem, grande parte delas, alguma lição de moral, temos sempre maus e bons. O lobo mau e o capuchinho vermelho, a branca de neve e a bruxa má. Mas não estamos perante uma história infantil, estamos perante a realidade. Infelizmente há muitos maus disfarçados de bons por este mundo fora que nos vão incutindo coisas, distorcendo a realidade ou mesmo inventando mentiras. Tudo com uma única intenção, destruir.

A primeira vítima da guerra é a verdade! Não podemos garantir que tudo o que nos entra pela casa adentro é 100% verdade, de ambos os lados.  É preciso refletirmos sobre isto. É preciso desenvolver nas escolas o pensamento crítico, a capacidade para refletir, pensar sobre as coisas, porque neste mundo onde vivemos temos uma sociedade que vai cada vez mais atrás do imediatismo, do populismo, do que é moda e não pára para pensar criticamente, para refletir antes de emitir a sua opinião com base em factos reais e na confirmação desses factos. Esta guerra não se resume a maus e bons. O povo ucraniano e o povo russo que não se revêm nas posições dos seus líderes estão em sofrimento. Muitos deles são bons, de ambos os lados. Os russos não são todos maus, nem os ucranianos são todos bons. O povo ucraniano está a ser atirado para a destruição do seu país, alguns (os que conseguem) estão a fugir e a pedir auxílio e no meio do azar têm a sorte de ser acolhidos por toda a Europa. E é assim mesmo que deve ser, devemos sempre ser solidários com o povo que sofre, com quem mais precisa, nos momentos de maior angústia, sem distinções. O povo russo (144 milhões) está a ser discriminado por todo o mundo como se fossem todos seguidores de Putin. Até expulsaram uma equipa russa dos jogos paralímpicos! Como se já não bastasse o sofrimento e discriminação destas pessoas, são agora impedidas de participar numa das poucas coisas que lhes dá alegria. E este é apenas um exemplo. Como é possível todas estas e outras atitudes de ódio contra um povo? Têm estes 144 milhões culpa das ações do seu líder? Muitos milhões de russos não apoiam as ações de Putin.

O ser humano é um ser estranho, tanto acolhe e é solidário, como discrimina e maltrata, depende do que lhe é incutido. Os que mais sofrem são sempre os mesmos. Lutemos de uma vez por todas pela Paz no mundo, sem hipocrisias. Como diz o Papa Francisco, sem armas. Acabem-se as armas no mundo, pois só assim teremos Paz.

“Roda Viva”, 17 de Março de 2022