Não dando para ganhar a vida, que uma última visita a Arouca possa dar para sossego da morte. Porque são dois dias, diz-se, a vida, e dia e meio já lá vai. E o cronista não queria desta para melhor ou, se calhar, para pior, ficando a dever a si próprio nunca mais regressar a Arouca: ir-se-ia tão inquieto que haveria de sentir-se na obrigação de voltar por ela!
No «como começar» tem no entanto o cronista, este cronista, ano após ano esbarrado. E já lá vão oito! Mas este último fim-de-semana lá me decidi. E pretextos não faltavam: Feira das Colheitas (que, afinal, foi cancelada) e jantar de encerramento da campanha da CDU/Arouca (Ah, que bela campanha, a da nossa Lara)!
Imagine agora o leitor perante um drama como este: arranjar nas profundezas da alma (e das leituras) subtilezas capazes de aguentarem assuntos políticos (conforme o solicitado pelos meus camaradas e amigos), não estando eu nada virado para aí! Afinal, se eu ali estava, apenas se devia à saudade.
Uff, já descarregou o cronista o seu segredo! Assim, à míngua de espaço e talento, fique esta crónica por aqui. . . apenas por um poema. Que o tempo que o leitor perca com ele (caso não goste de poesia) lhe seja descontado no sítio onde todas as coisas se pagam!
AROUCA, A LOUCA
Arouca desfralda-se toda num rosto de mulher.
Louca à noite, louca de dia,
num beijo infinito.
senhora de risos, cheia de graça,
pele que arde em mármore e granito,
cabelos soltos nos jardins de um convento,
bosque de ouro pela solitária extensão
de montes e vales,
fonte de aguardente com mel,
afundando-se no chão da praça.
Quando Arouca ri, na sua voz louca,
é todo o céu que nos invoca
com o seu riso de criança.
Vêmo-la em cada estrela
fluindo para os nossos olhos
como um rio de luz
despenhando-se em urzes e giestas.
Então, ela – e só ela – deveras louca,
torna as horas num vertigem diáfana,
na ternura escaldante que nos alcança,
para nos entregar a vida que buscamos:
o brilho dos nomes que sustentam a felicidade.
25.09.21 – Arouca