Muitas vezes, os pre­con­cei­tu­osos não se con­si­deram pre­con­cei­tu­osos. «Até tenho um amigo que é», como diz a velha piada. Mas o pre­con­ceito vem sempre ao de cima.

Du­rante a cam­panha elei­toral, a SIC e o Ex­presso des­ta­caram-se no pre­con­ceito contra a CDU. As peças pré-fa­bri­cadas, en­ce­nadas, os re­mo­ques azedos, a or­to­doxia do guião da der­ro­cada imi­nente, foram quo­ti­di­anos na co­ber­tura da SIC. O Ex­presso que, enfim, tenta ser mais fino e se ca­lhar até tem um amigo que é, teve um des­lize que deve ficar para os anais da his­tória da im­prensa por­tu­guesa. Pelo menos na parte da que tem mesmo muita piada, ainda que in­vo­lun­tária.

Na edição de dia 24 de Se­tembro, úl­timo dia de cam­panha, o Ex­presso fez um ba­lanço da cam­panha. O da CDU é do pior, claro está. Trans­crevem-se as me­lhores ti­radas, com a de­vida vénia à au­tora:

Du­rante a cam­panha, o Se­cre­tário-geral do PCP «falou sempre para os mesmos do cos­tume, os mi­li­tantes da pri­meira hora, agora e como sempre, nas pri­meiras filas dos co­mí­cios», «o ce­nário de fundo era sempre o mesmo a rodar pelo País, a mesma banda so­nora, as mesmas ca­deiras, as mesmas ban­deiras», «os ad­ver­sá­rios podem andar à solta, os ou­tros lí­deres vão ao molho e fé em deus, mas na CDU só há más­caras, dis­tân­cias e se­gu­rança total», «Je­ró­nimo falou sempre e só para os mesmos do cos­tume, para uma pla­teia re­pleta de in­de­fe­tí­veis, muitos deles fun­ci­o­ná­rios ou re­for­mados do par­tido, ou can­di­datos ora à junta, as­sem­bleia mu­ni­cipal ou câ­mara nas listas da CDU». Isto é o re­sumo do que a se­nhora viu, falta o que a se­nhora previu:

«A isto junta-se a di­fi­cul­dade em se­gurar as 24 câ­maras co­mu­nistas, como Se­túbal, Al­cácer do Sal ou mesmo Évora», numa lista de de­sejos que talvez cor­res­ponda a al­guma ge­o­grafia pes­soal, mas que não acertou em ne­nhum re­sul­tado.

A isto lá no Ex­presso deve chamar-se jor­na­lismo, ob­jec­ti­vi­dade, notas de re­por­tagem, cri­a­ti­vi­dade. Não tem se­quer ves­tí­gios de pre­con­ceito, porque lá na Im­presa não há disso.

Há no en­tanto uma parte da pá­gina in­teira que o jornal de­dica à CDU que é re­fres­cante de tão certa. Per­gunta o Ex­presso a Je­ró­nimo de Sousa: «o mais di­fícil desta cam­panha?» Res­posta: «con­tras­tando com o apoio e con­fi­ança que sen­timos com o de­correr da cam­panha, a di­fi­cul­dade maior foi a que re­sulta da forma pre­con­cei­tuosa que a SIC e o Ex­presso im­pri­miram à co­ber­tura da cam­panha da CDU». Podia ter acres­cen­tado «de acordo com a prova junta», mas era de facto dis­pen­sável. Porque o pre­con­ceito ex­plica-se a si pró­prio nos res­tantes ca­rac­teres da pá­gina.

“Avante!”, 30 de Setembro de 2021