Na edição online do jornal “Expresso” foi publicado, no 5 de agosto de 2021, o artigo de opinião “Rankings das escolas: onde irá parar a escola pública?”, da autoria do gestor Samuel Faria, preocupado, segundo afirmava, com a tendência de desaparecimento das escolas públicas do Top 50 do Ranking das escolas. 

Ao ler a peça ocorreu-me o seguinte exercício. Vamos fazer de conta que os exames não são redutores, o grau de dificuldade e os seus critérios de correção não variam de ano para ano e que as escolas são apenas escolas com populações escolares mais ou menos homogéneas.

Sendo o indicador do rendimento escolar a nota de exame há quatro variáveis a considerar: a matéria-prima (alunos), os recursos materiais (equipamentos escolares), os treinadores de exames (professores), a técnica de treino (prática pedagógica).

Com a criação do ranking das escolas consolidou-se como palavra-chave do sistema a seletividade. No top 50 (o top escolhido pelo autor do texto) foi-se concentrando a matéria-prima com mais potencial, os treinadores foram-se especializado em como conseguir a única coisa que interessa, a nota do exame, e a técnica de treino aprimorada (prática pedagógica e avaliação focadas nos exames).

A introdução das duas alterações propostas por Samuel Faria, autonomia das escolas públicas para escolherem treinadores e aprofundarem a técnica de treino e subsidiação das escolas privadas para acolherem os alunos pobres com potencial, acentuaria mais ainda a seletividade existente. Tendo em conta que os ganhos no desempenho escolar conseguidos com as variáveis treinadores e técnica de treino tendem a harmonizar-se e o investimento em recursos materiais também, a variável determinante seria, cada vez mais, a matéria-prima.

Teríamos, portanto, uma acentuação do processo de concentração da matéria-prima por potencial e a sua estratificação ao longo da tabela das escolas. 

Olhando para o sistema no seu todo, duas questões podem ser levantadas:

– O aumento de rendimento escolar (notas de exame) no top 50 significará o aumento do Saber, no sentido clássico do termo, da população escolar?

– O aumento do rendimento escolar (notas de exame) no top 50 terá como consequência o aumento do rendimento escolar (notas de exame) das restantes escolas, particularmente nas posicionadas nos últimos lugares do ranking?

Arrisco uma comparação. Será que o excelente resultado olímpico das modalidades técnicas do atletismo nacional, resultante da qualidade do trabalho de alto rendimento da federação, é concomitante com a melhoria do nível de desempenho motor dos portugueses em geral?             

Cá na terra não tenho notado melhoria de desempenho da população no triplo salto!

Arouca, 9 de agosto de 2021

“Expresso”, 13 de Agosto de 2021 – publicado parcialmente.