Intervenção preparada por Francisco Gonçalves (União dos Sindicatos de Aveiro, Sindicato dos Professores do Norte) para o XIV Congresso da CGTP – Seixal, 14 e 15 de Fevereiro de 2020

Francisco Gonçalves
Camaradas,
“Por uma Europa que respeite a soberania dos países e a melhoria das condições de vida dos povos” é o propósito inscrito no nosso projecto de programa de acção. Tem sido esta, é esta, a orientação da União Europeia? Não, não é nem tem sido. Partindo do mundo do trabalho no distrito de Aveiro umas breves notas sobre a questão.
Mais de 40 anos depois da adesão à CEE e duas décadas de moeda única, é importante olhar para o percurso feito. Mesmo considerando as crises cíclicas, são dois momentos distintos, o antes da moeda única e o período da moeda única. Nos anos 80 e 90 do Sec. XX com fundos comunitários pródigos, o investimento público forte, o consumo em alta, a economia a crescer … e a sepultura a ser cavada, trocava-se produção por consumo e salário por crédito, abria-se a caixa de pandora das privatizações e iniciava-se o processo de adesão ao euro.
Ao virar do milénio emergiu das catacumbas o que estava a ser construído, uma moeda cara, relembremos o câmbio, um euro igual a 200,482 escudos. Ora, num distrito como o de Aveiro, com muita micro, pequena e média empresa, forte produção na agricultura, nas pescas, no têxtil, no calçado, na cortiça, segmentos de baixo valor (com pleno emprego alardeavam, por lá, os patrões), a casa veio abaixo.
Para quem produz mercadorias de baixo valor e vê a moeda aumentada duzentas vezes a unidade, ergue-se um muro na exportação (Portugal terá perdido 30% de competitividade). E o mercado interno com a estagnação económica, a subida do desemprego, a contenção salarial, o rebentar das dívidas na era do euro e a invasão de produtos importados (da União Europeia, principalmente, e com o contributo das grandes cadeias de distribuição), deparou-se com o mesmo muro e o país com o défice externo.
Entretanto, consumadas praticamente as privatizações nos sectores estratégicos, chegou a vez das Funções Sociais do Estado – Saúde, Educação e Segurança Social. Sintetizava Passos Coelho em Aveiro, algures em 2012: O problema do país é o Estado, onde ainda existe Estado é necessário tirá-lo, onde só existe Estado é necessário introduzir Privado. Com isto florescerá a concorrência, com a concorrência aumentará o produto, com o aumento do produo melhorará o rendimento das famílias. Pois, o problema é que a tal concorrência tem levado ao(s)monopólio(s).
O programa da troika (os que a trouxeram e/ou aplicaram), concebido para salvar a banca, arruinada nos seus jogos de casino, à custa dos trabalhadores e dos pensionistas, serviu para limpar as dívidas do sector financeiro e entregá-lo à banca espanhola, seguindo escrupulosamente o guião da concentração bancária ibérica gizado pelo BCE e União Europeia, o EUROBIC é o exemplo mais recente.
Quatro anos após os anos de chumbo do governo PSD/CDS, com alguma recuperação, conquistas até, de direitos e rendimentos, o menu da União Europeia é mais do mesmo: União Económica e Monetária, Semestre Europeu, Tratado Orçamental e Pilar Europeu dos Direitos Sociais, ou seja, SUBMISSÃO.
Na governação económica o espartilho não alivia, primeiro era o défice nos 3 p. p., depois o défice-zero, agora é o excedente orçamental (de 0,2% em 2020 a 0,5% em 2023) para pagar a dívida pública sem a renegociar. Assim se tolhem o Investimento Público e as Funções Sociais do Estado e se impede a valorização e o rejuvenescimento da Administração Pública. Assim não se desenvolve o país.
O Pilar Europeu dos Direitos Sociais e o seu intuito em transferir competências nacionais – a negociação colectiva, salários, legislação laboral e Funções Sociais do Estado – para a União Europeia representa mais uma machadada na soberania do país e nas condições de vida dos povos. Não nos iludamos, não será esta EUROPA, com o seu tique vitoriano do “fardo do homem branco”, cada vez mais federalista, militarista e neoliberal, contemplando o Mediterrâneo, esse “muro natural”, onde os indesejados se afogam aos mil, a trazer o progresso e o bem-estar.
Exemplo disso é a proposta de Salário Mínimo Europeu da Comissão Europeia. Afinal não é salário mínimo luxemburguês para todos, nem uma “aproximaçãozita” que seja, apenas uma correlação com o salário médio de cada país. Aplicando à risca tal “medida progressista”, hoje Portugal teria de baixar o salário mínimo para não entrar em incumprimento.
Camaradas,
Nós somos CGTP, defendemos a soberania de Portugal e a melhoria das condições de vida do nosso povo, lutamos pelo aumento geral dos salários em Portugal, a melhor forma de respeitar a nossa soberania e a dos outros povos europeus.
A luta continua.
Viva a CGTP.