1. Na tentativa de esconder a existência do estado capitalista enquanto estado de classe, enquanto ditadura da burguesia, o discurso dominante insiste na tese de que o neoliberalismo é um sistema libertário, que dispensa o estado.
A social-democracia europeia reconhece hoje que «mudou radicalmente de atitude face ao estado», ao longo do século XX: em 1.º lugar, porque abandonou a «posição libertária de querer destruí-lo [ao estado capitalista], como dominação e factor de dominação burguesa»; em 2.º lugar, porque houve uma mudança no que toca à «arquitectura institucional do estado.» Em Portugal, Augusto Santos Silva apresenta o estado capitalista como um «espaço de integração social e intervenção política para as organizações vinculadas ao movimento operário», como «expressão da comunidade política nacional», como «espaço de pertença de toda a colectividade», como «representação política de toda a sociedade.»
Num tempo em que «as eleições são obscenamente caras», o direito a participar no estado transformou-se num ‘bem’ que tem de se ‘comprar’ no mercado, e este ‘mercado’, como todos os outros, é controlado pelo grande capital: a soberania do cidadão (como a soberania do consumidor) é pura fantasia. Quem tem dinheiro, ganha as eleições. E todos sabemos que não há almoços grátis… Como sublinha Stiglitz, «os mercados são modelados pela política», porque «as políticas determinam as regras do jogo económico», sendo certo que «o campo do jogo está inclinado para os 1% do topo», porque «as regras do jogo político também são moldadas por esses 1%.»