A Páscoa propicia sempre uma ida ao Minho e um regresso às memórias da juventude, um rosto ou espaço são suficientes. E foi assim este ano. Na esplanada do Ribeirinho vejo dois rostos desses tempos, Ingénua Sofia e Amarga Maria, duas cachopas, corpo e espírito esculpido pelo tempo, mantendo, apesar disso, o encanto de outrora.  Os trocadilhos que se tinham gerado com aqueles nomes nos folguedos juvenis! Enfim, memórias.

Aproximei-me, sem que me tenham visto, e apanhei-as numa daquelas discussões sobre a felicidade, uma dizendo que era pelo DAC que ela vinha, a outra, pelo contrário, era pelo DAC que ela ia. Diabo de professores, só falam de Escola, como se a Escola fosse o mundo todo, quando apenas tem lá todo o mundo, no caso da Escola Pública. Falavam de um curso profissional, cujo nome não fixei, e da organização de uma visita de estudo, a qual gerava uma guerra de trincheiras. Curioso, registei o diálogo.

IS – Com este projecto foi possível, no segundo período, os alunos tomarem em mãos a concepção, realização e avaliação do produto. É um avanço notável para estes alunos, um caso de sucesso ao nível de um PMI Portugal.
AM – 3 meses de aulas e 12 reuniões da equipa educativa para fazer uma visita de estudo?


IS – Não sejas assim! Foram eles que escolheram os locais a visitar, definiram o programa e trataram da contratação do transporte, tudo em trabalho interdisciplinar.
AM – O mês Janeiro de aulas e reuniões para escolher o sítio, o de Fevereiro para fazer o programa e o de Março para contratar o transporte e a visita ainda por fazer, é em Junho, em Abril decidimos o material a levar e Maio a ementa do farnel! Anda tudo doido?
IS – Lá estás tu! Em Janeiro debatemos e decidimos a técnica para escolher o local, um brainstorming, funcionou bem e deu para aplicar em Fevereiro, em Março fizeram pesquisa e estudos de mercado e depois, bem aquilatadas as opções, tomaram a decisão final.
AM – Qual estudo de mercado qual carapuça, foram os professores que fizeram tudo, eles limitaram-se a aparecer nas aulas às vezes, a más horas e resmungando sempre que despertados da soneca ou obrigados a escrever mais de uma linha. A única coisa que aprenderam foi que os professores trabalham para eles e que o sucesso escolar está garantido. Uma farsa!
IS – Estás a exagerar! Houve necessidade de ir ao encontro dos alunos e de dar alguns reforços positivos, de os motivar. A Escola tem que dizer alguma coisa aos meninos pobres e com mais dificuldades, é a única maneira de lhes garantir igualdade de sucesso.
AM – Enganas-te querida! Assim, apesar dessas pias intenções, é a maneira de os perpetuar onde estão. Saem da Escola sem saber ler nem escrever e sem nenhuns hábitos de trabalho, pontualidade e assiduidade. Saem condenados … e para sempre!
IS – Não te estou a conhecer, estás muito amarga!!
AM – É do nome. Se calhar acontece o mesmo contigo!!!

Resolvi interromper. Cumprimentos e beijinhos, a  conversa encaminhou-se para os tempos idos, para os folguedos juvenis, os decentes, porque dos indecentes não se fala em público.           

(*) DAC – Domínio de Autonomia Curricular, in DL n.º 55/2018, de 6 de Julho.

 

Arouca, 19 de Abril de 2019